A moda é política: o que podemos interpretar com a roupa de Melania Trump na posse?
Melania Trump, esposa do presidente Donald Trump, comunicou poder, distanciamento e autoridade em sua escolha de vestuário na posse de Donald Trump. Uma análise que revela como até o silêncio visual pode carregar mensagens políticas.
No dia 20 de janeiro de 2025, Melania Trump, com um conjunto elegante e austero, caminhou ao lado de Donald Trump no Capitólio dos Estados Unidos para a posse do 47º presidente do país. Vestindo um casaco azul-marinho trespassado, uma saia lápis de lã e um chapéu de aba larga que quase escondia seu olhar, Melania parecia intocável. Criado pelo designer Adam Lippes, o visual era uma combinação de formalidade e sobriedade. À primeira vista, a escolha parecia neutra, mas, é impossível ignorar que o estilo transmite mensagens, mesmo que inconscientemente.
Embora Melania não seja conhecida por usar a moda como uma ferramenta de expressão deliberada, suas escolhas atuam como reflexos do momento político e social. Neste caso, as roupas que pareciam despretensiosas comunicavam, mesmo que indiretamente, autoridade, distanciamento e uma reafirmação silenciosa dos valores que circundavam o governo Trump.
A neutralidade não é neutra A escolha de um conjunto azul-marinho de corte militarizado se alinha a um momento em que Donald Trump buscava consolidar uma imagem de autoridade e controle. Embora Melania muitas vezes evitasse declarações explícitas, o contexto no qual as roupas foram usadas oferece interpretações inevitáveis.
A sobriedade da silhueta e a ausência de detalhes ornamentais indicavam um afastamento de qualquer tentativa de humanizar ou suavizar sua figura pública. Ao contrário de primeiras-damas como Michelle Obama, que frequentemente usavam cores vivas e designs inovadores para criar uma imagem de inclusão e acessibilidade, o look de Melania parecia deliberadamente distante. Seu chapéu de aba larga, que quase escondia os olhos, adicionava um elemento de anonimato — ou talvez de proteção, como se ela buscasse se afastar do escrutínio público.
A rigidez da silhueta escolhida por Melania remete a códigos de vestimenta militares, reforçando uma mensagem de poder e disciplina. Historicamente, roupas inspiradas no militarismo têm sido usadas para comunicar autoridade, estabilidade e controle em tempos de incerteza política. Desde as jaquetas estruturadas de Margaret Thatcher até o uso de cortes rígidos por figuras públicas como Angela Merkel, a moda militarizada carrega significados que vão além da estética.
No caso de Melania, essa escolha pode ser lida como uma extensão visual do governo Trump, que frequentemente se posicionava de maneira combativa em relação à oposição política e aos movimentos progressistas. Ainda que a intenção de Melania não fosse transmitir essa mensagem diretamente, o contexto inevitavelmente a associa a essas ideias.
Outro ponto importante é o tom emocional do visual. Diferentemente de primeiras-damas que usaram a moda para aproximar sua figura pública da população, como o famoso vestido acessível de Michelle Obama na posse de Barack Obama, Melania escolheu um visual que parecia mais apropriado para reforçar sua posição como figura de elite.
O uso de luvas de couro pretas, sapatos de salto alto e a paleta sóbria criam um efeito de inacessibilidade, quase como se ela fosse intocável. Essa escolha também dialoga com a evolução de seu estilo ao longo dos anos, cada vez mais marcado por linhas austeras, bainhas longas e silhuetas que evitam qualquer traço de vulnerabilidade.
Contexto social
As escolhas de Melania na posse de Trump foram amplamente discutidas nas redes sociais, especialmente devido à semelhança com os trajes da série The Handmaid’s Tale. Na distopia, roupas severas simbolizam a submissão feminina em um regime patriarcal. Embora Melania não tenha intencionalmente buscado essa comparação, é impossível desvincular suas roupas do contexto político e social do governo de seu marido, caracterizado por retórica conservadora e frequentes ataques aos direitos de mulheres e minorias.
A neutralidade visual de Melania contrasta ironicamente com o impacto de suas escolhas. Em um período de polarização extrema nos Estados Unidos, mesmo roupas discretas podem ser interpretadas como um reflexo das tensões sociais. É nessa relação entre intenção e percepção que a moda se torna uma linguagem política, mesmo que de forma não planejada.